domingo, 26 de agosto de 2018

Li

Há muito tempo que eu escuto sobre espaço,
sobre o que talvez fosse ideal para mim.
Sobra tanta gente que se foi
e eu sóbrio encarando um ventilador.

Inundado na maré de um quarto vazio,
Afogado nessas trouxas de ilusão,
Migratória e indigesta sensação
de que fujo a cada estrada que se abrir.

Tanto céu e tanto verde pra voar
Mas um sabiá não pensa em ser banal.
Tanto rouco ou pranto seco e sem aval
só se prende onde se ouvir o seu cantar.

sábado, 23 de junho de 2018

O Poço


Eu que achei que era por conta
Das situações que te envolvi
Era pra te resgatar a duras penas
Mas a corda veio de ti, e era pra mim.

E eu que achei que era só imagem,
Que a fermata só estava ali.
Mas tinha mais água nesse poço...
E era de se esperar que era em ti...

...que eu ia repousar o meu olhar,
depois que me ajudasse a me escalar.
E mesmo eu te puxando cá embaixo
Teu canto é onde o canto deixa traços.

Se um som qualquer me faz cantar,
Se um som maré te fiz amar,
Se a mim me coube desatar
A ti não coube mas tu veio se encaixar

E eu que achei que era balela
De minha lama te ocupei
Tuas pernas bambas me balançam,
E era de esperar que era em ti...

terça-feira, 24 de abril de 2018

das mil estrelas

a estrada é mais adiante,
mas não vejo ruelas.
as luzes me passam constantes,
e eu entendo teus poréns.

sei que esvazio o teu espelho,
e sei que a mente não reage.
mas teu nome soa quase como um verbo
que eu grito na esperança de amar-te.

sob o teto das mil estrelas,
sobre o tempo que atordoa,
verás que a noite não se engana,
verena a noite que te ecoa.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

reflexo

eu vejo cá embaixo
do fundo da perdição

olho cada traço
e escorro ao pegar em tua mão

me afogo em mim mesmo
no fundo desse escuro

e tu, que voas solene,
será que olhas ao chão?

nem maré, nem minhas ondas
nada supera teu pouso

borda a letra na voz
e embaixo eu me acanho

borboleta veloz,
pousando em meu mundo langanho,

borbulha uma algoz
dos tempos de estio em que estanho





a volta

me pergunto se é normal
os poetas largarem-se às traças
como estantes não limpas
em períodos de trocas.

já prometi tantas vezes
reunir minhas confissões
e em frívolo minuto engasgado
jogá-las ao ar, como quem grita.

mas tantas vezes a inércia me vem
me beija os lábios e prende meus versos
as frases, cada vez mais longas,
vão se perdendo como um amém.

mas tanto faço e tanto vivo
e tanto caminho sem rumo
que o olhar fixa como um crivo
em luzes difusas de um anjo.

eu sinto que volto
como a águia ao ninho,
como a água à boca
como um guia ao caminho.

as frases me vem
como vem as canções
teu canto apazigua
minhas contravenções.



quinta-feira, 9 de abril de 2015

rápido.

eu lamento
que não possa falar-te agora.
eu te ausento
a força de um alento que penhora.
eu entendo
que tragas no peito um amor que é meu.
mas não nego
que é agora que quero o gosto teu.
se eu te tenho
é quando um dia não dura mais nada.
se é sem vida
é longe que tua poesia é entoada.
vem pra mim
que é do teu lado que viro luz.
não demora
pr'eu viajar nos teus olhos azuis.
esquece a vida
faz da morte o escárnio a dois.
mas não sofre
só a luz no perfeito que sois.


domingo, 29 de março de 2015

soneto de morrer de amor

e se eu morresse agora?
do teu amor me padecesse?
terias ainda o gosto do beijo
e a vontade de ficar?

e se agora eu me esfriasse
por trazer o fogo ao corpo
e tornar-te rubro a face
pra gozar-te do meu gozo

no axioma do nosso afeto
eu crio e reviro as frases
adefuntado de amor idioleto

no oximoro da nossa sina
este defunto cheio de vida
por ti é mortalmente apaixonado